domingo, 30 de novembro de 2008

Frango com Quiabo

Algumas coisas carregam a memória afetiva de uma vida inteira. E por mais que pareça estranho, pra mim, o frango com quiabo é uma delas. Os domigos da minha infãncia eram sempre iguais. Ensolarados, mesmo com chuva.

Eu acordava sentindo o cheiro do tempero da minha mãe, que mesmo relutante em admitir, cozinhava muito bem. Cozinhava? Sim, ela declarou guerra a cozinha na minha adolescência - eu com quinze e ela com com 32! Jovem, linda, guerreira e eternamente insatisfeita. Aquariana, por assim dizer.

Mas voltando às memórias. Os domingos eram incríveis. Meu pai entrava no meu quarto, abria a janela e dizia sorrindo: oi pequenina, hora de abrir os olhos! Ele me fazia cócegas, coisa que me irritava profundamente e me fazia gargalhar até não poder mais. Enquanto isso, meus irmãos jogavam Atari, minha mãe fritava o alho, a cebola e refogava o frango. Sempre reclamando do quiabo, que insistia em não se desapegar da baba.

Minha casa, no interior de Minas, tinha um jardim com pequenas flores que não sei o nome, uma varanda que pra mim parecia enorme onde sempre andávamos de bicicleta, uma sala com um tapete peludo que me dava alergia quando eu me deitava nele e uma enorme alegria quando sentada com meus irmãos, eu jogava "Gênios".

O Dani, meu irmão do meio, nunca, jamais, em tempo algum, tirava a sua roupa de super-homem. Pra lavar era uma luta inglória da minha mãe com o herói. Aos domingos, ele "voava" pela varanda e gentilmente, me convidava a ir junto. Eu aceitava. Já voamos muito por aí.

Meu pai, lia o jornal e dizia que a crise e o governo ainda acabariam com ele. Hoje ele não lê mais o jornal em sinal de protesto, mas continua dizendo que a crise e o governo vão acabar com ele.

Eu não sabia direito que crise era essa e nem o motivo de tamanha descrença com o governo, mas achava que ele estava exagerando um pouco. Ainda assim me preocupava e solidária, fazia cócegas nele. Coisa que ele também devia odiar.

O Dé, meu irmão mais novo e temporão, tinha sempre as bochechas vermelhas. É que nós, os membros da família "Do Re Mi", apertávamos aquela criatura incansavelmente. Tadinho, pagou caro por ser o bebê de plantão.

Pronto o frango com quiabo, todos sentávamos no sofá posicionado sobre o tapete peludo, diante da Tv que mostrava o Domingo no Parque - até hoje não entendo o por quê desse nome, já que era transmitido de um estúdio fechado e feio - e comíamos felizes aquele almoço que minha mãe havia passado a manhã inteira preparando.

A sobremesa era banana frita com mel e canela. Depois, eu, mocinha que era, ajudava meus pais a organizar a bagunça daquela cozinha. Sim, meu pai lavava a louça. Era um trato entre "Vera Maria e Adilson José" que em hipótese alguma poderia ser quebrado.

Daí todos tirávamos uma soneca, com exceção do André, que nunca dormiu na vida. A insônia ali é crônica desde sempre.

Pra mim e para os meus irmãos, o domingo acabava quando a música do Fantástico começava a tocar, logo depois que os Trapalhões se despediam. Hora de ir pra cama e rezar com meus pais - que sempre colocavam cada um dos pequeninos em seus aposentos - "meu anjo da guarda meu bom amiguinho, me leve sempre para o bom caminho".

Boa noite filha. Boa noite mãe, boa noite pai e até o próximo frango com quiabo.

Um comentário:

gi sakamoto disse...

será que infância em minas é tudo igual??? hahahaha =)))

Fico triste até hoje com a música do Fantástico. Ouço aquele "uuAA" e já me bate uma tristeza sem fim. Era um post it sonoro lembrando que o dia seguinte era dia de acordar cedo e fazer lição. Não é muito diferente de hoje né? Só que hoje meus problemas são maiores que a prova de ciências sociais. Hoje preciso achar uma solução para crise. Há! uuAA